Inteligência Artificial ou Estratégica em Escritórios de Advocacia ?

(texto publicado na Revista Conceito Jurídico – Edição Julho de 2018)

 

Estamos vivendo uma verdadeira febre (“hype” para os mais chics) de publicações, discussões e prognósticos sobre os efeitos da aplicação da Inteligência Artificial nos serviços Jurídicos e na profissão do Direito.

Não estou alheio às evoluções tecnológicas; não sou cético nem refratário a elas, muito ao contrário, sempre fui e serei amante e muito curioso com tudo que a tecnologia nos reserva para o futuro. Também não tenho a visão “dark” sobre o futuro como alguns autores e cineastas pregam, mas por outro lado, não vejo um “caminho de rosas”. A minha visão é mais pragmática e enxergo a tecnologia, no caso da profissão do Direito, como uma ferramenta de extrema utilidade, mas sempre uma ferramenta!

Não vamos nos iludir. O efeito que a tecnologia e especificamente a IA irá causar nos serviços será sem precedentes e não me atrevo a prever como será o futuro próximo. Porém, uma coisa é certa: essas mudanças exigirão uma adaptação enorme de todos os profissionais envolvidos nesse mercado!

Faço uma analogia com o que ocorreu com a profissão dos torneiros mecânicos na indústria. Nas décadas de 70 e 80 essa profissão era a mais bem cotada e bem remunerada, pois apenas uns poucos bons sabiam manejar os tornos e conseguiam criar as peças contidas nos projetos precisamente (com tolerâncias mínimas dimensionais) por conta de suas habilidades manuais para manejar aquela máquina complicada. Com o advento dos tornos computadorizados, a profissão de torneiro mecânico não foi extinta, mas todos aqueles profissionais tiveram que se adaptar e desenvolver outros atributos e hoje esses profissionais tem que ter habilidades para operar computadores e não “colocam mão na máquina” mais.

Outro ponto a ser considerado é que a Inteligência Artificial ainda engatinha no campo de sua utilização nos textos, palavras e linguagem oral e escrita. Lembremos que as tecnologias de busca de palavras (Google) deslanchou no final dos anos 90 e aquelas envolvidas em tratamento de números (bancos de dados relacionais) datam do início dos anos 60, ou seja, um gap de 40 anos, pelo menos. Na atualidade a grande maioria dos sistemas mais recentes desenvolvidos utilizam uma serie de algoritmos matemáticos / estatísticos, de cognição semântica, de “machine Learning” e tudo isso associado a um aumento exponencial na capacidade de processamento doa computadores atuais.

Tudo isso contribui de maneira decisiva para o aumento da produtividade dos advogados, permitindo que diminuam em mais de dez vezes os tempos necessários para a produção de documentos, mas não interferem na capacidade e nas escolhas das decisões gerenciais e estratégicas que devem ser tomadas por seus gestores.

Como tenho reiterado, o grande desafio dos gestores jurídicos (sejam proprietários de escritórios ou diretores de departamentos jurídicos) é a mudança do mercado, que cada vez mais espera e exige empresas mais ágeis, com soluções inovadoras e menos custosas.

Nesse ponto é que entra a Inteligência Estratégica !

O conjunto de pensamentos de como enfrentar e vencer nesse mercado cada vez mais competitivo é o que na língua inglesa, sempre muito mais concisa, se define o como o “mindset”.

Esse mindset deve ser mais abrangente que a simples busca do aumento de produtividade (que também deve ser perseguida), mas deve também comtemplar:

– A análise de todas as estatísticas internas financeiras, de dedicação do profissionais (timesheets), de eficiência nas cobranças, na acuidade orçamentaria, na qualidade na precificação de propostas, etc., ou seja ser uma gestão data centric”.

– A análise dos mercados e dos players (concorrentes e consumidores) por meio de uso da chamada big data, identificando tendências, a competição e as mudanças de comportamento.

– A mudança da visão de toda a organização para enxergar os compradores de seus serviços como consumidores e não como clientes.

– A mudança na postura de fornecedor de serviços para efetivo parceiro, entendendo profundamente do negócio de seu cliente/consumidor auxiliando-o juridicamente e participando ativamente nas suas decisões estratégicas.

– A constante busca pela inovação nos seus serviços tentando sempre surpreender os clientes e não simplesmente satisfazê-los. Contradizendo a matemática, criar uma condição onde o necessário NÃO é o suficiente.

– A busca da efetiva solução para o negócio de seu cliente, agregando o máximo valor possível (mesmo que seja propor um acordo). Lembrando sempre que a melhor solução para o negócio do cliente pode não ser obrigatoriamente a melhor solução jurídica.

– A mudança da própria auto visão: os escritórios de advocacia, a mudança para “empresa prestadora de serviços intelectuais jurídicos” e os departamentos jurídicos a mudança para “parceiro estratégico legal do CFO”.

– A gestão profissional de sua empresa, principalmente na avaliação correta de seus sócios e sua relativização racional.

A Inteligência Artificial veio para somar e não para substituir. A melhor empresa será aquela que utilizar a Inteligência Artificial para maximizar a sua Inteligência Estratégica!

José Paulo Graciotti é consultor, autor do livro “Governança Estratégica para escritórios de Advocacia”,  sócio da GRACIOTTI Assessoria Empresarial, membro da ILTA– International Legal Technology Association e da ALA – Association of Legal Administrators. Há mais de 28 anos implanta e gerencia escritórios de advocacia – www.graciotti.com.br

Seu Escritório ainda não faz Timesheet ?

Em todas as minhas visitas a escritórios de advocacia, quando estamos discutindo gestão, faço sempre a mesma pergunta: Vocês fazem timesheet? Na maioria da vezes escuto invariavelmente duas respostas.

A primeira e mais frequente é que não se faz e as razões variam desde a dificuldade de se conseguir convencer advogados e sócios para fazer, até simplesmente achar que não é necessário.

A segunda, menos frequente, é que se faz para aqueles trabalhos cobrados por hora, mas não o fazem para aqueles trabalhos cobrados de outra forma (fixo, partido, etc.) e o principal argumento utilizado é que pelo fato de não cobrarem por hora, não há a necessidade de se controlar as horas dispendidas.

Grande Engano!

No meu ponto de vista, isto se deve historicamente ao fato de que os honorários advocatícios sempre permitiram aos escritórios uma folgada margem de resultados tornando-se desnecessário esse controle. Após a crise mundial de 2008, agravada pelos motivos internos de nosso país nos últimos anos, a pressão por preços e pela maior competitividade cresceram de forma exponencial em todos os mercados.

Some-se a isto o fato de que as empresas internacionais, por conta dos sistemas de faturamento eletrônico (Serengetti, Tymetrix, etc.) impostos aos escritórios, possibilitou a estas fazerem estatísticas comparativas para avaliar seus prestadores de serviços e escolher os mais competitivos.

O mercado quer prestadores de serviços ágeis, de qualidade e competitivos!

Como então conseguir ser mais produtivo, gerir melhor sua equipe, orçar correta e rapidamente com menor taxa de erro, ter mais controle sobre a rentabilidade de sua proposta, ou seja, ser mais eficiente e rentável se você não sabe o que seus advogados (a equipe) está efetivamente fazendo?

Conforme eu discuti este assunto em meu livro “Governança estratégica para Escritórios de Advocacia”, no capitulo dedicado à “analytics”, a elaboração correta e tempestiva do timesheet em todo o escritório possibilita a utilização das seguintes ferramentas de gestão:

1 – Ferramenta de gestão de equipe pois, pode (e deve) avaliar:

– a performance / eficiência ao comparar os tempos gastos em cada tarefa e o tempo esperado ou normal para cada uma por tipo de profissional.
– a dedicação ao comparar os tempos marcados versus as metas estabelecidas.
– a coerência entre o tipo de trabalho e a experiência (senioridade) do profissional.
– a distribuição das tarefas em função da senioridade.
– a melhor distribuição da equipe de modo a minimizar tempos ociosos.

2 – Ferramenta de gestão dos assuntos do cliente pois, pode (e deve) avaliar:

– quais trabalhos estão sendo elaborados para cada assunto ou cliente.
– quais profissionais estão envolvidos.
– como anda a evolução do trabalhos.
– quais são as previsões de conclusão ou etapas

3 – Ferramenta de controle e planejamento de custos, avaliando:

– os valores gastos em termos de custos horários de profissionais versus valores cobrados (principalmente nos casos de cobrança fixa).
– qual deverá ser a melhor distribuição da equipe nos assuntos, alocando profissionais coerentes com a complexidade e valores cobrados.

4 – Ferramenta de auxílio orçamentário pois, consegue:

– levantar e avaliar casos anteriores, observando valores cobrados, custos gerados, equipes envolvidas e principalmente resultados obtidos.

5 – Ferramenta de avaliação de:

– performance / eficiência por equipe, setor, área, centros de custo ou filial.
– rentabilidade quando associado aos controles financeiros e de apropriação de custos.

A única exceção, na minha opinião, apenas os escritórios processualistas de volume, no chamado contencioso de massa estão dispensados da execução do timesheet. Nesses escritórios, os trabalhos geralmente são distribuídos por tarefas especificas de modo que cada advogados faz uma pequena parte do processo (entendendo aqui processo como parte do fluxo). Desta forma, os próprios sistemas de automação têm controles de produtividade de cada parte do fluxo, desobrigando o profissional de marcar seus trabalhos em outro controle (timesheet).

Por fim gostaria de alertar para a observação mais importante sobre tudo isso que foi levantado, ou seja: Não basta fazer, tem que controlar!

A revisão consciente e detalhada do timesheet permite ao gestor não só expurgar tempos inúteis ou não produtivos, analisando a real performance do profissional e da equipe, mas também avaliar o impacto das decisões comerciais (descontos, etc.) na produção e no orçamento da proposta.

A correta revisão por parte dos gestores (sócios ou coordenadores nas estruturas maiores) é fundamental para que se possa extrair dessa ferramenta números confiáveis que irão dar os principais subsídios no auxílio às decisões operacionais e estratégicas de qualquer escritório de advocacia.

José Paulo Graciotti é consultor, autor do livro “Governança Estratégica para escritórios de Advocacia”,  sócio da GRACIOTTI Assessoria Empresarial, membro da ILTA– International Legal Technology Association e da ALA – Association of Legal Administrators. Há mais de 30 anos implanta e gerencia escritórios de advocacia – www.graciotti.com.br

 

O Advogado e a Tecnologia

Você se lembra do filme “Pretty Woman” estrelado por Richard Gere e Julia Roberts? Umas das primeiras cenas mostra ele apanhando para o conseguir sair dirigindo seu Lotus Esprit com câmbio mecânico, pois só sabia lidar com cambio automático na sua vida e então ela aparece e “salva sua vida”!

Bem, não estamos aqui para discutir o filme. Ele foi produzido em 1990 e já faz 28 anos desde a sua apresentação ao publico (em termos de tecnologia isso é uma eternidade)! Como ele se comportaria com um painel e/ou volante de automóveis mais modernos, sem chaves, com sensores de digitais, paddles shifts, controles de suspensão, definições de modo de direção, etc.?

A figura metafórica que quero utilizar para os dias de hoje é de um volante de Formula 1, onde o piloto tem em suas mãos todos os controles eletrônicos de seu carro, tem que saber utilizá-los de maneira precisa estando pilotando a uma velocidade de mais de 300 km/h. Como é possível?

Isto somente é possível com a seleção minuciosa de alguns pilotos que tem essa habilidade, com muita força de vontade e persistência, tendo passado e sido vencedores em categorias inferiores (onde os controles são mais simples e as velocidades mais baixas) e se submeterem a um intenso treinamento em simuladores e nas pistas para chegar onde estão. E o mais importante de tudo e quererem fazer isso!

Trazendo a discussão para a prestação de serviços jurídicos e para os advogados, como esses profissionais acostumados a trabalhar de modo tradicional (câmbio automático) irão se adaptar e se preparar para as novas tecnologias que estão sendo incorporadas à profissão?

Sou um defensor ferrenho da tecnologia e um otimista em relação ao que esta poderá trazer para todos nós no futuro, mas precisamos nos adaptar e preparar para sabe utilizá-la para nosso benefício. Por outro lado, sou extremamente crítico ao que algumas empresas e a mídia especializada vem propagando sobre essa mesma tecnologia, ou seja, que é muito simples de ser implementada, que resolve todos os problemas e que substituirá a figura humana em pouquíssimo tempo!

Colocando sob o foco correto, as tecnologias apresentadas até o momento na profissão do Direito, ou seja, análises preditivas, automação de documentos, buscas inteligentes, processamento de linguagem e várias outras irão efetivamente impactar negativamente aqueles profissionais que estão no “câmbio automático”, mas também irão oferecer vantagens competitivas enormes para aqueles que estiverem dispostos e preparados para utilizá-las.

Novamente a mesma pergunta feita anteriormente: Como será possível? E a resposta é exatamente a mesma!

Não sendo reativo e tendo a mente aberta para entender que a tecnologia (como sempre) vem para ajudar; tendo critério na hora de escolher corretamente aquela que se adapta à sua necessidade; adotando progressivamente tecnologias mais complexas, aprendendo a lidar com elas e ajustando corretamente à sua realidade e por fim se submetendo a um intenso processo de treinamento e adaptação pessoal.

Outro ponto que faço questão de lembrar é que a maioria dessas tecnologias estão direcionadas para a “gestão da operação jurídica”, trazendo maior produtividade para quem estiver preparado para utiliza-la, mas há ainda a questão da “gestão do negócio jurídico” (especificamente para escritórios de advocacia e departamentos jurídicos) onde outros fatores devem ser levados em consideração, tais como, gerenciamento de equipes, gestão de processos (internos, não jurídicos), liderança, atendimento a clientes, gestão financeira, marketing e estratégia do negócio.

Sendo repetitivo, todas as tecnologias vão e irão ajudar cada vez mais aquele gestor jurídico que estiver preparado para ser mais eficiente, produtivo e competitivo, portanto prepare-se !

José Paulo Graciotti é consultor, autor do livro “Governança Estratégica para escritórios de Advocacia”,  sócio da GRACIOTTI Assessoria Empresarial, membro da ILTA– International Legal Technology Association e da ALA – Association of Legal Administrators. Há mais de 28 anos implanta e gerencia escritórios de advocacia – www.graciotti.com.br

 

 

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